Exclusão de blog e obstáculos tecnológicos

Data do Julgamento:
17/09/2015

Data da Publicação:
18/09/2015

Tribunal ou Vara: Vara Cível - Pontal do Paraná - PR

Tipo de recurso/Ação: Cautelar Inominada

Número do Processo (Original/CNJ): 0002642-18.2015.8.16.0189

Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Juíza substituta Amani Khalil Muhd Ciuffi

Câmara/Turma: -

Ementa:

"Visto os autos de CAUTELAR INOMINADA autuado sob n.º 2642-18.2015.8.16.0189 movida por (...) em face de CODEX WORDPRESS BRASIL E OUTRO.

O autor sustenta que vem ocorrendo divulgação de matérias jornalísticas as quais denigrem a imagem do requerente, imputando-lhe crime de corrupção, causando-lhe sérios danos, tendo em vista tratar-se de prefeito municipal.

Diante disso, pediu, em sede liminar, que seja determinado a exclusão do blog FOLHA PONTAL DO PARANÁ, bem como seja determinada a inclusão de obstáculos tecnológicos para que inviabilizem o acesso à mencionada página até o julgamento do feito. (...)"

  • Rafael Fernandes Maciel
    Rafael Fernandes Maciel em 03/04/2016

    Trata-se de decisão liminar em medida cautelar, ajuizada pelo prefeito de Pontal do Paraná - PR em desfavor do “Blog Folha Pontal do Paraná”, Codex Wordpress Brasil e outro. Alega o político ter sido vítima de inúmeras matérias jornalísticas ofensivas imputando-lhe crime de corrupção, publicadas no referido blog e, desta feita, postula via cautelar a exclusão do blog, bem como ordem para inclusão de obstáculos tecnológicos a fim de inviabilizar o acesso à página até o julgamento do feito.

    A decisão ora comentada chama atenção em dois aspectos. O primeiro refere-se à proporcionalidade de uma ordem de exclusão de todo o blog por conta de algumas notícias ofensivas; e, segundo, a questão técnica de cumprimento de ordens destinadas a blogs hospedados nos domínios Wordpress.

    A Lei nº 12.965/14 ao disciplinar o uso da Internet no Brasil, pautou-se no direito à liberdade de expressão e à privacidade como seus principais fundamentos. A liberdade de expressão é estampada nos artigos 2º, 3º, 8º e 19º, sendo considerado um princípio para o uso da Internet.

    Obviamente, como todo direito fundamental, a liberdade de expressão pode ser relevada quando fere outros direitos fundamentais como a honra e dignidade da pessoa humana, cabendo ao operador do direito sopesar os direitos conflitantes para, assim, buscar um equilíbrio.

    Sem adentrarmos nos detalhes do caso concreto, fato é que havendo uma matéria ofensiva, e aí considerada ilícita, justificam-se ordens de remoção do conteúdo tido por ilegal. Essas ordens, no entanto, não podem ultrapassar os limites exatos da remoção apenas do conteúdo infrator, sob risco de se tornarem desproporcionais e inadequadas, ferindo aí sim a liberdade de expressão. Não por outra razão que o §1º do artigo 19 ao tratar sobre os pedidos de remoção do ilícito, exige a indicação precisa do local onde se encontra o material e, em casos como de blogs, a indicação das URLs de cada matéria é o melhor caminho e não a exclusão de todo o blog, como se ele só servisse às práticas ilícitas, quando, na realidade, traz também matérias jornalísticas relacionadas a interesses da sociedade de Pontal do Paraná e não relacionadas à vítima do caso concreto.

    O Marco Civil precisa ser compreendido num todo. Em casos de violações ou necessidades de identificação da personalidade jurídica (pessoa natural ou jurídica) que postou a ofensa, a própria Lei nº 12.965/14 prevê a requisição judicial de registros, por ordem judicial, como meio para se buscar a autoria e, conseguinte, permitir à vítima o ajuizamento de outras medidas inibitórias e com maior efeito prático, sem que seja necessário tirar do ar todo um blog, sobretudo quando esse contém outras informações à comunidade local.

    Ainda que se chegue à necessidade de impor uma ordem tão extrema, a questão técnica que surge da decisão também merece considerações. Isso porque o blog está hospedado no serviço Wordpress, em servidores fora do país, e sem que a empresa possua escritório de representação no Brasil, não se pode aplicar as previsões dos artigos 11 e 12 do MCI. Em tais hipóteses, é comum ser buscada a efetivação do direito pelos intermediários (provedores de conexão, por exemplo), no entanto, não nos aparenta que a chamada da Abranet para compor o polo passivo surtirá o efeito necessário, vez que ainda que não possuiria a capacidade legal de impor a seus associados, provedores de conexão, as referidas medidas de bloqueio de acesso ao site infrator. E, ainda, que assim pudesse, a ordem tal qual proferida poderia inviabilizar o acesso a inúmeros outros sites hospedados no mesmo serviço Wordpress, configurando uma grave violação ao MCI ao prejudicar terceiros que nenhuma relação possuem com o blog dito infrator.

    Casos assim, nos trazem a necessidade de refletir sobre a importante missão do OMCI e de profissionais da área em trazer esclarecimentos aos operadores do direito para que os pedidos sejam tecnicamente viáveis e, por conseguinte, as decisões sejam mais adequadas e proporcionais, aplicando-se o direito da vítima, sem prejudicar o direito de terceiros, de forma efetiva e sem ferir a liberdade de expressão, direito tão caro aos usuários da Internet.

    Até a elaboração desse comentário o blog continuava disponível e o processo suspenso por 180 dias, sem que tenha havido modificação relevante.