Remoção de conteúdo requerida pela União
Data do Julgamento:
30/11/2017
Data da Publicação:
05/12/2017
Tribunal ou Vara: Tribunal Regional Federal da 3ª Região - TRF3
Tipo de recurso/Ação: Apelação Cível
Número do Processo (Original/CNJ): 0020007-02.2015.4.03.6100, 0028283-86.2015.4.03.0000 e 0005229-57.2016.4.03.0000
Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Des. Federal Carlos Muta
Câmara/Turma: 3ª Turma
Artigos do MCI mencionados:
Artigo 19 e parágrafos e artigo 22.
Ementa:
"DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSTITUCIONAL. NULIDADE. DECISÃO-SUPRESA NÃO CONFIGURADA. INTERNET. PROVEDOR DE COMPARTILHAMENTO DE VÍDEOS. IMAGEM DE CONTEÚDO OFENSIVO. ATO DE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E MANIFESTAÇÃO DE PENSAMENTO. CENSURA. HONRA E IMAGEM. ILEGITIMIDADE ATIVA DA UNIÃO.
1. O reconhecimento, na sentença, da ilegitimidade ativa não gerou decisão-surpresa, pois a questão foi discutida em recurso perante o Tribunal e sobre o tema foi a autora instada nos autos originários à manifestação, quando se quedou inerte.
2. A questão da ilegitimidade confunde-se, de resto, com o próprio mérito da causa. De fato, a visualização do vídeo permite verificar que o autor não trata de questões relativas à intimidade ou vida privada, mas de supostos ilícitos praticados no âmbito da Administração Pública, inclusive com indicação de nome de servidores, envolvendo ações e práticas investigadas pela Operação Zelotes. O autor do vídeo, que informa ter sido fiscal da Receita Federal, lançou imputações, buscando associar a sua demissão do cargo público a perseguições em razão de críticas e oposição a práticas ilícitas verificadas, denunciadas tanto à Receita Federal, como Polícia Federal e Ministério Público Federal, que teriam deixado de investigar e apurar os fatos.
3. As narrativas, imputações, qualificações e acusações, naquilo que forem lesivas à honra e imagem de servidores públicos e membros do Ministério Público Federal, devem ser objeto de discussão e providências em via própria. A veiculação do vídeo, enquanto ato de manifestação de pensamento, expressão e crítica, não pode ser passível de censura, uma vez que a identidade do autor do vídeo foi registrada tanto de forma escrita como verbal na divulgação do conteúdo, descrevendo nomes e situações relativas a fatos funcionais, não cabendo, aqui, formular qualquer juízo de reprovabilidade civil ou penal.
4. A liberdade de expressão e manifestação do pensamento, que independe de censura ou licença, inexistindo anonimato, não pode ser coibida judicialmente, sem prejuízo do direito à indenização a partir do momento em que do exercício de tal liberdade resulte a violação da honra e da imagem das pessoas. A partir do momento em que veiculada, por vídeo na internet, as narrativas, imputações, qualificações e acusações, o autor responde pela conduta praticada na esfera civil e penal, dentro do sistema, adotado pela Constituição de 1988, baseado na liberdade com responsabilidade.
5. A União não possui legitimidade ativa para a defesa da honra e imagem das pessoas que foram nominadas no vídeo, ainda que relativas a atos funcionais praticados. Em relação à honra e imagem das instituições, o Ministério Público tem personalidade jurídica própria para atuar em sua defesa
institucional.
6. A prática da censura, que se pretende viabilizar, além de inconstitucional, tem efeito colateral grave, pois tende a ampliar, promover e impulsionar a publicidade e a curiosidade pública sobre o material, de sorte a atrair atenção e repercussão muito além do que verificado até então.
7. A jurisprudência admite a exclusão da veiculação do conteúdo apenas quando possam suscitar algum perigo social ou à ordem pública (por exemplo, divulgação de mensagens de ódio racial ou de gênero), sendo criteriosa e seletiva na limitação do exercício da liberdade de expressão e manifestação do pensamento e informação.
8. Embora a liberdade de manifestação e expressão do pensamento e da informação não permite a censura preconizada, evidencia-se, por outro lado, que eventual dano que decorra de tal divulgação pode gerar discussão judicial de responsabilidade civil extensível à agravante, na ótica de que o risco do negócio é de quem o explora e continua a explorá-lo ainda depois de advertido, por via judicial, de eventual dano à honra ou imagem alheia.
9. Apelação desprovida."