Exclusão de vídeo supostamente ofensivo

Data do Julgamento:
03/12/2014

Data da Publicação:
15/12/2014

Tribunal ou Vara: Tribunal de Justiça do Distrito Federal - TJDFT

Tipo de recurso/Ação: Apelação

Número do Processo (Original/CNJ): 0018676-70.2013.8.07.0001

Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Desª. Gislene Pinheiro

Câmara/Turma: 4ª Turma Cível

Artigos do MCI mencionados:

Artigo 5º, VII, artigo 19 e artigo 21.

Ementa:

"APELAÇÃO CÍVEL. OBRIGAÇÃO DE FAZER. YOUTUBE. GOOGLE. EXCLUSÃO VÍDEO. CONTEÚDO OFENSIVO. MÍDIA NÃO JUNTADA NOS AUTOS. JULGAMENTO DE MÉRITO. ERROR IN PROCEDENDO. NÃO CONFIGURADO. CONTEÚDO INDEVIDO CONSTATADO POR OUTROS MEIOS DE PROVA. REMOÇÃO DO CONTEÚDO. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUATIVA. LEI NOVA 12.965/14. APLICABILIDADE. DANO DECORRENTE DE CONTEÚDO GERADO POR TERCEIROS. PROVEDOR APLICAÇÕES INTERNET. RESPONSABILIDADE NÃO CONFIGURADA. ARTIGO 19 E ARTIGO 21.
1. O apontamento do endereço virtual (URL) pelo autor na exordial não se confunde com a produção da prova documental do conteúdo do vídeo, todavia, diante do regramento processual vigente (Art. 302 e Art. 334, CPC), o magistrado deve presumir verdadeiros os fatos não impugnados, bem como conhecer dos fatos que não dependem de prova.
2. A sentença que julga improcedente o pedido, com resolução de mérito, sem considerar o vídeo disponibilizado no link de internet não configura error in procedendo, ou seja, erro de procedimento do magistrado, porquanto tal prova documental não era essencial para a instrução válida do processo.
3. Constatado nos autos que o conteúdo gerado por terceiro no provedor de aplicações de internet é indevido, deve-se tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente.
4. Aplica-se a regra de responsabilidade por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros da Lei 12.965/14 à lide decorrente de conteúdo publicado por usuário na internet antes de sua vigência, desde que o conteúdo permaneça disponível, em razão dos efeitos da relação jurídica continuativa.
5. “(...) o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.” (Art. 19 da Lei 12.965/14)
6. “O provedor de aplicações de internet que disponibilize conteúdo gerado por terceiros será responsabilizado subsidiariamente pela violação da intimidade decorrente da divulgação, sem autorização de seus participantes, de imagens, de vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado quando, após o recebimento de notificação pelo participante ou seu representante legal, deixar de promover, de forma diligente, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço, a indisponibilização desse conteúdo.” (Art. 21 da Lei 12.965/14)
7. Recurso conhecido, preliminar rejeitada. Apelação parcialmente provida."

  • - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ]
    - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ] em 03/02/2015

    O Marco Civil da Internet foi concebido para que fosse possível determinar algumas regras claras para os casos de remoção de conteúdos, "com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura". E a produção de prova em ambiente virtual é sempre questão crucial.

    O conflito se verifica nos casos em que não é possível alcançar resolução por denúncia do usuário ao próprio canal apropriado do provedor de conteúdo ou de aplicação. Em muitos casos o problema pode assim se resolver, amigavelmente e de forma mais célere. Ou em contrapartida, tornar a produção de eventual prova judicial mais difícultosa se o conteúdo tiver sido apagado ou estiver indisponível por motivo ou outro.

    Em se tratando de conteúdos multimídia, como vídeos no Youtube, é importante diferenciar o apontamento da URL da produção de prova documental acerca do conteúdo em si. Em obediência ao artigo 333, I do CPC, há necessidade da prova do alegado - necessidade de colação da mídia em si aos autos, condição que foi julgada essencial para que haja a devida avaliação para motivação . Situação que, na ausência, foi contornada pela existência de fatos incontroversos nos autos, e outros meios de prova, dentre os quais poderíamos citar a ata notarial.

    A maior dificuldade parece ser de ordem técnica, ou tecnológica. Nem sempre é tarefa fácil obter êxito em salvar um conteúdo multimídia. Ele pode estar protegido para cópias, tornando a operação ainda mais difícil (questão meramente tangencial, vide o art. 46, VII da Lei 9.610/98). Portanto, no caso de sua impossibilidade, deve-se justificar por cautela que mesmo diante da ausência de produção da prova documental (juntada aos autos de cópia do vídeo), tal inação ainda assim atenderia ao disposto no § 1° do art. 19.

    Em alguns casos pode acontecer do vídeo ter sido publicado anteriormente à vigência da Lei 12.965/14, mas continuar no ar quando da propositura da ação. Por ainda encontrar veiculação na Internet, "configura uma relação jurídica continuativa que se submete à lei nova no que tange ao plano de eficácia, uma vez que não se fala em ato jurídico perfeito". Precedente da Sexta Turma do STJ.

    Se mesmo em sede de apelação ainda não havia sido emanada ordem judicial específica para tornar indisponível o conteúdo apontado, acabaria por afastada a responsabilidade civil do provedor de serviços pelos danos decorrentes do conteúdo gerado por terceiro.

    E por não se tratar de "vídeos ou de outros materiais contendo cenas de nudez ou de atos sexuais de caráter privado", a teor do art. 21 do MCI, entendeu-se como inaplicável a responsabilidade subsidiária pelo fato do provedor de conteúdo não ter indisponibilizado o conteúdo após notificação extrajudicial.

    Bastante previsível que haja cada vez mais alegações de nulidade por parte do eventual recorrente com base na suposta ausência dos requisitos consubstanciados no § 1° do art. 19. Desejável que a jurisprudência se consolide rapidamente na questão probante, no sentido da obrigatoriedade ou da suficiência e em prol da ampla defesa.