Liberdade de expressão e interesse da coletividade
Data do Julgamento:
14/06/2016
Data da Publicação:
16/06/2016
Tribunal ou Vara: 15ª Vara Cível Central - São Paulo - SP
Tipo de recurso/Ação: Despacho
Número do Processo (Original/CNJ): 1047364-83.2016.8.26.0100
Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Juiz Fernando Antonio Tasso
Câmara/Turma: -
Artigos do MCI mencionados:
Artigo 2º; artigo 3º, I; artigo 5º, VII; artigo 10; artigo 15, caput e § 1º; artigo 19 e § 4º; artigo 21; e artigo 11, § 2º do Decreto 8.771/16.
Ementa:
"Trata-se de relação jurídica cujo diploma de regência é a Lei 12.965/14, o Marco Civil da Internet.
A liberdade de expressão é garantia individual prevista no artigo 5º, inciso IV da Constituição Federal que nesse diploma legal tem função bifronte. É seu fundamento (artigo 2º) e seu primeiro princípio (artigo 3º, inciso I). Inegável, portanto, a preocupação da norma com a preservação dessa garantia individual, limitada apenas em casos expressamente previstos.
O conteúdo gerado por terceiros, reputado lesivo pelo ofendido e existente em provedor de aplicação, somente gera responsabilidade civil deste se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente (artigo 19, caput), salvo exceção legal (artigo 21).
É, portanto, atribuída ao Judiciário a tarefa de, ainda que em sede liminar, decidir a respeito da manutenção da disponibilidade do conteúdo, considerando o interesse da coletividade (artigo 19, § 4º)."
Trata-se da primeira decisão que se tem notícia a aplicar o Decreto regulamentador da Lei n° 12.965/14 que entrou em vigor recentemente (em 10 de junho de 2016). E não só isso, a decisão é integral e exemplarmente alicerçada no Marco Civil da Internet.
Mais uma vez a liberdade de expressão é colocada em xeque, mas o magistrado bem observa que é "inegável" a preocupação da norma com a preservação dessa garantia individual.
Também observa o julgador a necessidade de sopesar o interesse da coletividade no caso da manutenção do conteúdo no ar, em sede liminar e em prestígio à própria liberdade de expressão:
Sem adentrar ao mérito, foi concedida tutela parcial e determinada a preservação do conteúdo da publicação por 6 (seis) meses, sem que se tenha determinado sua remoção, mas tão somente o fornecimento dos dados cadastrais do usuário que teria disponibilizado o vídeo no Youtube, nos termos do artigo 11, § 2º do Decreto n° 8.771/16, "para que possa tomar as providências judiciais cabíveis".
O § 2º do artigo 11 assim dispõe:
Por não ser o caso de processo tramitando em segredo de justiça, e envolvendo tema poêmico - "cura homossexual", corre-se o risco potencial de incidência no chamado Efeito Streisand, que segundo a Wikipedia "é um fenômeno da Internet onde uma tentativa de censurar ou remover algum tipo de informação se volta contra o censor, resultando na vasta replicação da informação".
Ou seja, tal conteúdo ao invés de removido em detrimento à liberdade de expressão e em celebração da censura, poderia acabar gerando em tese ainda mais interesse e audiência do que na ausência de demanda judicial com objetivos supressores.
Quanto ao mérito em si, a ser analisado posteriormente, caberá ao julgador decidir se é reprovável juridicamente a gravação em vídeo, supostamente pelo celular, e posterior divulgação na Internet a partir de 15 de fevereiro de 2016 (e neste momento com 1161 visualizações) conforme consta na página da aplicação, de conteúdo obtido dentro de templo evangélico, no qual segundo consta haveria vedação expressa de assim se proceder.