Monitoramento prévio e violação às leis da física

Data do Julgamento:
12/08/2015

Data da Publicação:
19/08/2015

Tribunal ou Vara: Tribunal de Justiça de São Paulo - TJSP

Tipo de recurso/Ação: Apelação Cível

Número do Processo (Original/CNJ): 0133073-16.2010.8.26.0100

Nome do relator ou Juiz (caso sentença): Des. Alexandre Coelho

Câmara/Turma: 8ª Câmara de Direito Privado

Artigos do MCI mencionados:

Artigo 19

Ementa:

"INTERNET - VIDEOS OFENSIVOS À IMAGEM DA AUTORA - SENTENÇA CONDENATÓRIA EM OBRIGAÇÃO DE FAZER - INCONFORMISMO - IMPOSSIBILIDADE DE SE IMPEDIR NOVAS INSERÇÕES DO VÍDEO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. Caracteriza censura prévia e atenta contra as leis da física e a liberdade de expressão comando judicial que obriga a Google a fazer monitoramento prévio daquilo que poderá vir a ser postado por seus usuários, a fim de se evitar reinserção de vídeo ofensivo. Obrigação de impossível cumprimento, substituída pela obrigação de proceder a retirada do vídeo em 24 horas, caso volte a ser postado, desde que notificado pela autora, nos termos do artigo 19, da Lei nº 12.965/14. Sentença parcialmente reformada. Apelação provida."

  • - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ]
    - Omar Kaminski - [ Gestor do OMCI ] em 29/08/2015

    Decisão que versa sobre a impossibilidade de "monitoramento prévio" de determinado conteúdo multimídia, a fim de impedir que haja novas ou futuras inserções do mesmo conteúdo - ao menos, no caso de um determinado vídeo considerado ofensivo à autora no site Youtube.

    No caso em tela, o desembargador Alexandre Coelho, da 8ª Câmara de Direito Privado, rechaçou a possibilidade de censura prévia, celebrando a liberdade de expressão.
     

    "O inconformismo é de ordem técnica: não há possibilidade de se conhecer previamente o conteúdo de futuras inserções, ainda não efetivadas".


    Igualmente cabe destacar da decisão:
     

    "Com efeito, não se pode sequer cogitar que a apelante possa ter acesso ao conteúdo de vídeo ainda não postado em seu site, para o fim de impedir a postagem dos vídeos aqui tratados. Aceitar tal possibilidade é negar as leis da física e contrariar a própria liberdade de expressão das pessoas, em inequívoca censura prévia, que obviamente não pode contar com o beneplácito do Poder Judiciário".


    O fato é que tal tecnologia de filtragem já existe, tecnicamente falando - e tem sido contornada ou burlada com relativa facilidade.

    Além de potencial violação à liberdade de expressão, também a privacidade é ameaçada caso o monitoramento ou filtragem de arquivos seja massivo, sistemático e indiscriminado. Devemos citar os detentores de direitos autorais significativos em busca de mais, ou de maior controle sob suas obras no ambiente digital como, talvez, os maiores incentivadores da adoção desse tipo de medida.

    O leque de possibilidades restritivas aumenta exponencialmente ao falarmos em inteligência artificial, algoritmos e reconhecimento facial, além de metadados e outras informações contidas nos arquivos. E sem qualquer "violação às leis da física" digna dos premonitórios "Precogs" do filme Minority Report (2002), mas ao arrepio de Orwell, pois são crescentes as possibilidades trazidas pela nanotecnologia e robótica, e pela chamada Internet das Coisas. Nesse contexto, os drones são problemas menores.

    Se a existência e manutenção de "listas-negras" contendo "páginas proibidas" ou "conteúdos censurados", constantemente monitorados e identificados por determinados padrões, é algo positivo, viável e mesmo necessário, em muitos casos a censura terá vencido. Mas ainda se pode cogitar da violação ao princípio da neutralidade previsto no art. 9º, embora não ainda regulamentado neste momento.

    Atualização (10/09/15):

    Em decisão de 01 de setembro de 2015 na Apelação 3002075-70.2013.8.26.0368, a 2ª Câmara de Direito Privado do TJSP decidiu no mesmo sentido, desobrigando o provedor de aplicações do monitoramento prévio, Ementa (grifamos):
     

    APELAÇÃO CÍVEL - CONTEÚDO DESABONADOR EM PROVEDOR DE HOSPEDAGEM – REMOÇÃO DE VÍDEO DO MEIO VIRTUAL – POSSIBILIDADE - OBRIGAÇÃO CUMPRIDA EM SEDE DE LIMINAR – PROIBIÇÃO DE DIVULGAÇÃO DE VÍDEOS COM O MESMO CONTEÚDO – IMPOSSIBILIDADE DE MONITORAMENTO PRÉVIOPROVEDOR DE HOSPEDAGEM QUE NÃO ESTÁ OBRIGADO À FISCALIZAÇÃO ANTECIPADA DE CADA NOVO VÍDEO COM O MESMO CONTEÚDO POSTADO – MULTA PREVISTA DESCABIDA - O CUMPRIMENTO DO DEVER DE REMOÇÃO PREVENTIVA DE NOVOS VÍDEOS FICA CONDICIONADO À INDICAÇÃO PELO OFENDIDO DO URL DA PÁGINA EM QUE ESTIVEREM INSERIDOS – DECISÃO PARCIALMENTE REFORMADA – RECURSO PROVIDO.


    Para o desembargador relator Giffoni Ferreira,
     

    (...) caso sejam postados novos vídeos, o Apelado deverá fornecer o endereço eletrônico, não cabendo a realização de monitoramento prévio.

    Decidir em contrário fôra espezinhar a Carta Magna, e o Princípio da Liberdade de Expressão, Criação e Informação.

    A buscadora não está impelida a realizar uma varredura em todo o conteúdo virtual dos hóspedes, senão os indicados pela R. decisão, sob pena de abuso de direito.